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25 de setembro de 2015

Trabalho escravo pode fazer empresas brasileiras perderem mercados

O trabalho escravo contemporâneo foi discutido na Conferência Ethos 360° que terminou na última quarta-feira (23) em São Paulo. Foram abordados temas como a suspensão da lista suja, as tentativas de retrocesso no combate ao trabalho escravo no Brasil e a necessidade de as empresas e governos se comprometerem com a resolução do problema no país – se não pela questão social ou humana, para garantir mercados.
Participaram do painel “Trabalho escravo ou só emprego ruim?”, promovido pelo InPACTO e pelo Instituto Ethos, Luís Camargo de Melo, Procurador-geral do Ministério Público do Trabalho, Marinalva Dantas, Auditora Fiscal do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, e Leonardo Sakamoto, Coordenador Geral da Repórter Brasil. A discussão foi mediada por Yuri Feres, Gerente de Sustentabilidade da Cargill.
Ameaças de retrocessos no combate
O procurador Luís Camargo de Melo afirmou que o poder público tem contribuído pouco para resolver o problema no Brasil. “A lista suja, uma das ferramentas mais importantes para o combate ao trabalho escravo no país, praticamente deixou de existir”, lamentou, referindo-se à suspensão da divulgação da lista do Ministério do Trabalho e Emprego, por liminar do Supremo Tribunal Federal no apagar das luzes de 2014. Outro problema apontado pelo procurador é a falta de auditores fiscais, que limita as operações de fiscalização.
Na opinião do procurador, o Brasil avançou muito nas duas últimas décadas, mas ainda precisa de políticas públicas e programas de qualificação de mão de obra que impeçam que o trabalhador seja envolvido na malha do trabalho escravo contemporâneo.
A tentativa, por parte de políticos e setores da economia, de exclusão dos termos “jornada exaustiva” e “trabalho degradante” do artigo 149 do Código Penal, que criminaliza o trabalho escravo, também foi apontada como um grande retrocesso. “A modificação na lei para incluir esses termos, em 2003, junto com a atuação das equipes de resgate fez com que avançássemos muito e fossemos reconhecidos internacionalmente por nossas práticas de combate ao trabalho escravo”, avaliou.

InPACTO leva o tema “trabalho escravo contemporâneo” para a Conferência Ethos 360º

Trabalho escravo ou trabalho ruim? 
A segunda convidada da mesa a falar foi a Auditora Fiscal do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego Marinalva Dantas. Marinalva, que participou da libertação de mais de 2.300 pessoas ao longo dos últimos vinte anos, comentou as dificuldades em lidar com o tema nas primeiras ações. “Quando o mundo se comprometeu a combater o trabalho escravo, em 98, já estávamos atuando há três anos. A prioridade era eliminar o trabalho infantil e erradicar o trabalho escravo. No começo tínhamos dificuldade até para pronunciar o termo trabalho escravo. Falávamos em trabalho forçado”, lembrou.
“Trabalho escravo é a antítese do trabalho decente.  As condições degradantes violam a dignidade humana”, afirmou. Segundo ela, são questões que vão muito além da segurança, da saúde e da informalidade ou de outros problemas trabalhistas. “As carteiras de trabalho viraram verdadeiras cartas de alforria contemporâneas”, concluiu.
A auditora também apresentou o histórico de ações contra o trabalho escravo desde que o Brasil reconheceu, perante a ONU, a existência deste tipo de exploração no país, entre elas: a criação do Grupo Móvel de Fiscalização (1995), o lançamento do Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (2003) e do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo (2005).
Quem lucra hoje pode perder amanhã
A última apresentação da mesa foi do coordenador a ONG Repórter Brasil, Leonardo Sakamoto, que chamou a atenção das empresas para os riscos do trabalho escravo em suas cadeias produtivas. “Trabalho escravo é gente atrás de lucro. Não é apenas uma questão moral, mas de ganhos econômicos. Nas Nações Unidas está havendo um debate forte sobre a responsabilidade das empresas nas questões de direitos humanos.  Ou o Brasil continua nessa caminhada do enfrentamento ao trabalho escravo ou vamos ter problemas econômicos no futuro, afirmou.
Ele ainda fez um alerta às empresas: “se você, como empresa, não quer fazer por questões humanas, faça por você para manter mercados. Os países desenvolvidos já estão começando a impor barreiras comerciais não tarifárias com justificativas sociais. Não porque são sociais, mas para proteger os seus mercados”.
Segundo o jornalista, “as pessoas acham que os ruralistas são os maiores interessados em diminuir o cerco ao trabalho escravo, mas na verdade, construção, frigoríficos e têxteis são os verdadeiros criadores de entraves para o combate ao trabalho escravo no país”.  Sakamoto também lamentou a suspensão da lista suja: “dentro do governo federal há interesse de manter a lista suspensa. Temos grandes problemas por medo do poder público. Isso não é uma questão partidária, envolve todos os partidos. O trabalho escravo é o topo de uma pirâmide de exploração e ele só existe porque existe a pirâmide inteira”, concluiu
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