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10 de dezembro de 2010

Escravizados derrubavam mata em fronteira agropecuária

Grupo de 11 que desmatava Floresta Amazônica estava “ilhado”. Vítimas dormiam em barracos de lona, sem alimentação adequada e em situação precária. Operação foi conduzida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT)

Por Bárbara Vidal

Operação coordenada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) encontrou 11 trabalhadores “ilhados” e escravizados no meio da Floresta Amazônica. Aliciados em Porto Velho (RO), eles estavam mais precisamente em Lábrea (AM) – município amazonense, na divisa com Acre e Rondônia, que vem apresentando altos índices de desmatamento nos últimos anos.
Para se ter ideia do isolamento, antes de ser libertado, um deles adoeceu e, para receber atendimento médico, teve primeiro que caminhar quase 80 km até chegar à Rodovia BR-364 para somente depois pegar uma carona que o deixou na cidade mais próxima, a mais de 200 km de distância. Os trabalhos da fiscalização foram concluídos em 1º de dezembro.
As vítimas, que tinham entre 18 e 35 anos e estavam no local há oito dias, atuavam no desmatamento de mata nativa em área de expansão da fronteira agropecuária. De acordo com o procurador do trabalho Audaliphal Hildebrando da Silva, que coordenou a ação, eles viviam em condições desumanas, com pouca comida à disposição, dormindo em redes sob barracas improvisadas de lona com abertura lateral, sem acesso a estruturas básicas (como instalações sanitárias e elétricas, bem como espaço de vivência), ou seja completamente alheios às normas estabelecidas.
Eram ainda submetidos a longas jornadas de trabalho. Segundo o que teria ficado acordado com o arregimentador de empreitada (comumente chamado de “gato”) Alcione Swenka, receberiam entre R$ 1,00 e R$ 2,00 por hectare (que tem proporção similar a um campo oficial de futebol) desmatado na propriedade pertencente ao fazendeiro Rafael Amaral.
Os trabalhadores utilizavam as águas de um igarapé próximo. Não estavam sendo utilizados equipamento de proteção individual (EPIs) regularmentares. “Estavam todos sem camisa e usando chinelos”, descreve Audaliphal. O grupo tinha que pescar o seu próprio peixe para se alimentar e, segundo o procurador, “havia arroz e farinha, mas era muito pouco”.
A previsão era que a derrubada da mata duraria por volta de 45 a 60 dias desde que foi iniciada. O ponto em que a situação foi flagrada, relata o representante do MPT, ficava a 350 km de Rio Branco (AC), capital estadual mais próxima. “O empreiteiro levou o grupo para lá e eles não tinham como sair. Estavam completamente ilhados”, completa.
A propriedade, conforme checagem inicial promovida pela fiscalização trabalhista, está cadastrada perante órgãos ambientais: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) federal, e o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam).
Independentemente do adiantamento de R$ 200 que as vítimas disseram ter recebido para começar a trabalhar, as condições degradantes e o isolamento geográfico contribuem para a caracterização do trabalho análogo à escravidão. A jornada começava às 8h e seguia até às 18h. Não havia qualquer comércio local nem as chamadas cantinas nas quais produtos são vendidos a preços superfaturados, típicos da servidão por dívida.
O “gato” Alcione Swenka e o proprietário Rafael Amaral foram localizados, por indicação das próprias vítimas, em Porto Velho (RO). O dono da área não fora autuado anteriormente por trabalho escravo.
Durante audiência sobre o caso, a fiscalização conduzida pelo MPT concluiu preliminarmente que o principal responsável pelo aliciamento da mão de obra e também pelo quadro encontrado teria sido o “gato”, responsável direto pelo recrutamento e pela execução do desmatamento.
As verbas rescisórias (que somaram R$ 900,00) foram pagas e cada trabalhador recebeu mais R$ 1 mil por danos morais, além do consequente encaminhamento para que as parcelas do Seguro-Desemprego do Trabalhador Resgatado sejam devidamente recebidas. Para aprofundamento das investigações, Audaliphal conta que o relatório da operação será remetido à Polícia Federal, que participou da fiscalização fazendo a proteção dos agentes públicos, assim como ao Ministério Público Federal (MPF) e à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Amazonas (SRTE/AM).

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