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26 de fevereiro de 2009

Grupo móvel liberta 12 pessoas de escravidão no corte de pinus

Vítimas estavam presas a dívidas contraídas em estabelecimento comercial indicado pelo empregador. Fiscais constataram terceirização ilegal, mas uma das empresas envolvidas se recusou a reconhecer vínculos empregatícios

Por Bianca Pyl

Os 12 empregados libertados de condições análogas à escravidão da Fazenda Ipanema, em Adrianópolis (PR), arcavam até com o combustível do transporte dos alojamentos às frentes onde trabalhavam no corte de pinus – árvore utilizada pelas indústrias de madeira e de papel e celulose.
Eles não recebiam regularmente, mas eram obrigados a assinar recibos como se o pagamento estivesse normal. Na prática, porém, eram explorados ilegalmente pelos empregadores. Valores relativos aos gastos com energia elétrica, aluguel e até a quantia de recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) eram descontados dos “salários” dos trabalhadores.
Os “salários” eram passados aos três chefes de cada turma, já com os descontos dos gastos de cada turma anotados numa planilha. Os chefes de turma, por sua vez, descontavam de cada trabalhador seus gastos individuais, tais como as ferramentas que cada um utilizava para trabalhar.
Além disso, os empregados estavam “amarrados” por meio de dívidas. Os três chefes de turmas faziam as compras no Supermercado São Francisco, no município de Tunas (PR), porque o estabelecimento tinha um acordo para vender “fiado” aos trabalhadores da Fazenda Ipanema.
Os chefes distribuíam os alimentos e o valor das compras era debitado dos “salários” de cada um. “Como o pagamento dos salários era muito irregular, os trabalhadores não tinham outra escolha a não ser aceitar esse esquema”, constata Guilherme Moreira, auditor fiscal do grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e coordenador da ação.
As frentes de trabalho no corte de pinus não tinham banheiros e nem locais adequados para a realização das refeições. Os empregados levavam o almoço e a água, que acabava no meio da jornada de trabalho. Com frequência, eles acabavam utilizando água de um córrego próximo.
Os 12 empregados dormiam em casas feitas de compensado de madeira e telhas de amianto, com muitas frestas que permitiam a entrada de animais. “As condições das moradias eram muito precárias e insalubres. O banheiro era um cubículo de madeira, sem esgoto”, define Guilherme.
O pagamento era feito por produção e a jornada durava até 12 horas diárias. Sete dos 12 trabalhadores viviam com suas famílias no local.
Terceirização
Somado ao cenário de completa precarização e servidão por dívidas, o grupo móvel identificou ainda a ocorrência de terceirização ilegal. Os funcionários estavam trabalhando desde agosto de 2008 com a Carteira de Trabalho e da Previdência Social (CTPS) assinada pela empresa J.A.R. Sobral. Contudo, os fiscais constataram que a real empregadora é a Compet Agro Florestal S/A, proprietária da fazenda e da madeira retirada pelos empregados.
A Compet faz parte do grupo Cocelpa Papéis e Celulose. “Eles não poderiam terceirizar uma atividade-fim que consta no seu estatuto social. Fica claro que o único objetivo desta terceirização era reduzir custos e, assim, precarizar a relação de trabalho”, explica o auditor Guilherme.
Na berlinda, a Compet não reconhece os vínculos empregatícios. “Não tínhamos conhecimento da situação dos trabalhadores. Nós rescindimos o contrato com a J.A.R. Sobral, após o pagamento das verbas aos trabalhadores”, declara Marcos Nauffal, representante da Compet.
“A responsável pela atividade de extração na região era a empresa J.A.R. Sobral, que mantinha os 12 funcionários em uma área externa aos limites da Fazenda Ipanema, fazendo-o por responsabilidade própria, omitindo tal fato à Compet”, adiciona Marcos. O Ministério Público do Trabalho (MPT) poderá ajuizar uma ação civil pública para cobrar a responsabilização da empresa.
As verbas da rescisão do contrato de trabalho foram pagas pela J.A.R. Sobral. O valor total ficou em quase R$ 60 mil. “Esse pagamento não implica que o vínculo empregatício da J.A.R. Sobral era legal”, ressalta Guilherme.
O procurador do Trabalho Luercy Lino Lopes determinou o pagamento de R$ 3 mil por dano moral individual aos trabalhadores. Foram lavrados 24 autos de infração por irregularidades também na área de saúde e segurança do trabalho. O grupo móvel que esteve na Fazenda Ipanema foi composto por auditores fiscais do MTE, um procurador do MPT e agentes da Polícia Militar Ambiental do Paraná, conhecidos como Força Verde.

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