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11 de dezembro de 2008

Operação no Paraná encontra trabalho infantil e degradante

Grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) flagra 39 pessoas em condições degradantes de trabalho. Fiscais flagraram ainda 15 crianças e adolescentes no corte de cebola em vila próxima a Irati (PR)

Por Bianca Pyl

No caminho para mais uma ação na área rural do Paraná, o grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) avistou um grupo de pessoas trabalhando na colheita de cebola, em Caratuva II, vila que fica a cerca de 15 km de Irati (PR).
Os fiscais decidiram parar e encontraram duas crianças de 3 e 5 anos de idade e mais 13 adolescentes (com idades entre 12 e 18 anos) trabalhando no corte de cebola. Todos estavam acompanhados dos pais. “Como nós sabíamos que são comuns irregularidades trabalhistas nessa atividade, decidimos parar”, conta Guilherme Moreira, auditor fiscal que coordenou a ação. A propriedade pertence a Claudinei Fernandes de Oliveira.
Diante do quadro, a fiscalização decidiu chamar o conselho tutelar do município para tomar as medidas necessárias e prestar assistência às famílias. “Só autuar o proprietário não é suficiente. Quando virássemos as costas, as famílias voltariam a trabalhar com seus filhos. As mães não entendem. Muitas acham melhor que o filho trabalhe. No caso de trabalho infantil é preciso uma ação mais ampla, que dê assistência às famílias”, relata Guilherme. A fiscalização se deu entre os dias 25 e 27 de novembro.
Os conselheiros tutelares foram até a propriedade e entrevistaram todas as famílias, que depois foram convocadas para uma reunião. “Precisávamos fazer um levantamento para saber por que as famílias mantinham seus filhos no trabalho e depois pensar uma ação de combate ao trabalho infantil”, explica Ademir Carneiro, presidente do Conselho Tutelar de Irati.
De acordo com Ademir, os pais alegaram ter começado a trabalhar desde os 12 anos e não entendem porque agora é proibido. “O trabalho infantil é muito difícil de combater porque as pessoas não compreendem. Não adianta só apagar incêndios (referindo-se as fiscalizações). É preciso prevenir. E isso é possível com informação e estrutura para as famílias”. Outro problema apontado pelas pais das crianças é a falta de creches públicas.
A colheita de cebola dura, em média, dois dias e é feita com uma faca pequena. “Quando chegamos era o primeiro dia de trabalho e eles provavelmente terminariam no mesmo dia”, detalha o auditor fiscal Guilherme. Nesse caso, o pouco tempo complica a questão da assinatura da carteira.
Ele sugere que esses pequenos produtores formem condomínios, para que possam contratar empregados com carteira assinada, dividir os encargos trabalhistas e pagar de acordo com a utilização da mão-de-obra. “Há exemplos de lugares onde isso funciona. Nas cooperativas, ficou comprovado que há fraudes. O condomínio é uma possibilidade legal, que garante os direitos dos trabalhadores sem pesar para o pequeno produtor”.
Mineração
A primeira fiscalização, dessa série de ações do grupo móvel no Paraná, se deu entre 19 e 20 de novembro e foi motivada por uma denúncia feita ao Ministério Público do Trabalho (MPT). A fiscalização na balsa de extração de diamantes da empresa Mineradora Tibagiana Ltda, no leito do Rio Tibagi, em Telêmaco Borba (PR), flagrou irregularidades na área de saúde e segurança do trabalho. Um mergulhador, por exemplo, utilizava uma mangueira de botijão de gás de cozinha para receber oxigênio quando mergulhava.
Os empregados não tinham registro na carteira de trabalho e moravam na própria balsa, que não tinha instalações sanitárias, nem local apropriado para as refeições. Os alimentos ficavam expostos sem nenhum tipo de proteção. As instalações elétricas também não atendiam à legislação. Os fiscais interditaram as máquinas e equipamentos (como vasos de pressão) e o trabalho foi suspenso.
“O proprietário da empresa registrou a CTPS [Carteira de Trabalho e Previdência Social] dos trabalhadores e está em processo de adequação às normas de segurança e saúde no trabalho estabelecidas pelo grupo móvel para poder voltar as atividades”, conta Guilherme Moreira.
Reflorestamento
Os empreendiementos de reflorestamento de pinus, em Irati (PR), eram os principais alvos do grupo móvel. Quatro madeireiras foram fiscalizadas. Três delas exploravam trabalhadores em condições degradantes. No total, 39 pessoas foram resgatadas.
Sete empregados foram resgatados da Fazenda São Francisco, do grupo F. V. Araújo. Eles dormiam em dois alojamentos de madeira totalmente irregulares, sem instalações elétricas e sanitárias. “O barraco era cheio de buracos e os trabalhadores dormiam lá de segunda a sexta”, conta Guilherme Moreira. O grupo comia no chão, sem nenhuma proteção contra intempéries. O empregador não fornecia Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) completos; apenas alguns itens eram oferecidos.
Os funcionários também não tinham acesso à água potável nas frentes de trabalho. A água de um córrego era utilizada tanto para beber quando para tomar banho. Foram lavrados 20 autos de infração e o valor das verbas rescisórias foi de R$ 41 mil. A Repórter Brasil entrou em contato com a empresa para ouvir algum representante mas não obteve retorno.
O grupo fiscal seguiu para as Fazendas Boa Vista e Pinho, do grupo Agostinho Zarpellon & Filhos. Os 22 funcionários não ficavam alojados nas propriedades, mas também estavam submetidos a condições degradantes. A saúde e segurança não eram respeitadas, os fiscais flagraram um funcionário aplicando agrotóxicos sem roupas especiais nem EPIs. Foram lavrados 13 autos de infração e as verbas rescisórias ultrapassaram R$ 104 mil. A Repórter Brasiltentou entrevistar Miguel Zarpellon, mas ele não atendeu as ligações.
A pior situação, segundo o auditor fiscal Guilherme Moreira, foi a encontrada na Fazenda Mariti, de propriedade de Orlando Corevar. Das dez pessoas resgatadas, três dormiam num abrigo chamado de gaiota (na carroceria de uma carreta, coberta com uma lona).
Outros três funcionários se alojavam num barraco de madeira, sem as mínimas condições de higiene e saúde. Não havia camas, os colchões ficavam no chão. O restante do grupo dormia em outro barraco, também sem condições exigidas pela legislação, mas que o auditor fiscal considerou “melhor que os outros”. Os barracos tinham fogões e botijões de gás, o que não é permitido. A água que os empregados consumiam vinha de uma caixa d´água aberta, e era muito escura.
“Trabalho em condições degradantes há onde tem empregador que não respeita a legislação trabalhista. Não é uma questão regional. Muitos dizem que no Sul não há problemas como no Pará. Eu vi situações, como a do alojamento gaiota, que não havia visto em fiscalizações no Norte do país”, declara Guilherme, coordenador da operação do grupo móvel.
Terceirização ilegal
Composto por oito auditores fiscais, cinco integrantes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e pelo procurado Luercy Lino Lopes, do Ministério Público do Trabalho (MPT), o grupo móvel concluiu que nas propriedades não havia o aliciamento típico, que conta com a figura do “gato” (aliciador de mão-de-obra), mas sim a terceirização ilegal.
“Verificamos que as empresas que terceirizam não têm a inidoneidade econômico-financeira, elas são abertas só para repassar a mão-de-obra”, explica o auditor Guilherme. Esse é o caso das empresas Prestadora de Serviços Santos e Conrado Ltda, Prestadora de Serviços Santa Joana Ltda e Pedro Cordeiro de Jesus, cujo capital totalizam R$ 11 mil, montante insuficiente para cumprir as obrigações trabalhistas dos mais de 50 trabalhadores contratados.
Guilherme explica ainda que havia exclusividade da prestação de serviços da Santos e Conrado Ltda para a empresa F. V. Araújo. Os proprietários Nicolau Conrado e Pedro Cordeiro de Jesus trabalhavam junto com os demais empregados, com cargos de chefes de turmas. A lei só permite a terceirização, desde que não seja dentro da atividade-fim da empresa e que não sirva apenas para reduzir os custos trabalhistas e debilitar as relações de trabalho. “A terceirização encontrada na região é apenas uma maneira de tentar tirar a responsabilidade do verdadeiro e único empregador: a madeireira”.

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