Catar pode ter morte de 4 mil trabalhadores até 2022
Nesta semana, um integrante do Comitê Executivo da Fifa, Theo Zwanziger, declarou acreditar que o Catar perderá o direito de sediar a Copa de 2022. A afirmação foi publicada pela revista de esportes alemã Sport Bild Plus e repercutiu em jornais do mundo inteiro. O motivo da mudança de sede, já discutido em outras ocasiões, seria o calor extremo que colocaria em risco a saúde de jogadores e torcedores.
Enquanto a Fifa se preocupa com as altas temperaturas, são os altos índices de violações de direitos humanos que deveriam estimular o afastamento do país como sede do Mundial. Para a Confederação Sindical Internacional (CSI), até que a primeira bola seja chutada na Copa de 2022, ao menos 4 mil trabalhadores terão morrido. Até março deste ano, o número de mortes de trabalhadores já tinha alcançado 444.
Há um ano, uma série de reportagens do jornal britânico The Guardian revelou que em menos de dois meses, entre junho e agosto do ano passado, 44 trabalhadores migrantes nepaleses morreram de ataque cardíaco, insuficiência cardíaca ou acidente de trabalho. A investigação também encontrou evidências de trabalho forçado em um enorme projeto de infraestrutura da Copa. Alguns trabalhadores estrangeiros vindos do Nepal alegaram que não foram pagos durante os seus meses de trabalho, seus salários foram retidos para que não tivessem condições de ir embora. Os passaportes também eram rotineiramente confiscados e os trabalhadores migrantes eram reduzidos à condição de estrangeiros ilegais. Muitos sofriam com a falta de acesso à agua potável em pleno verão, enfrentando o mesmo calor que agora preocupa a Fifa.
O secretário-geral da Federação Geral dos Sindicatos Nepaleses, Umesh Upadhyaya, declarou ao The Guardian que o efeito do calor não deveria ser uma preocupação apenas com centenas de jogadores de futebol, mas com os milhares de trabalhadores migrantes envolvidos na construção dos estádios. “Todo mundo está falando sobre o efeito do calor extremo do Catar em algumas centenas de jogadores de futebol, mas eles estão ignorando o sofrimento, sangue e suor de milhares de trabalhadores migrantes, que será a construção dos estádios da Copa do Mundo em turnos que podem durar oito vezes a duração de uma partida de futebol.”
Um dos trabalhadores, uma imigrante nepalesa empregada no desenvolvimento de Lusail (uma nova cidade de US$ 45 bilhões que vai ser construída a 15 km da capital Doha e incluíra o estádio de 90 mil lugares) declarou que gostaria de deixar o trabalho, mas a empresa não permitiria. “Eu estou com raiva do modo como a empresa está nos tratando, mas estamos desamparados. Lamento vir aqui, mas o que fazer? Fomos obrigados a vir só para ganhar a vida, mas não tivemos sorte”, desabafou em entrevista ao jornal.
A investigação do The Guardian também apontou que os alojamentos eram insuficientes e não apresentavam boas condições. Até 12 pessoas ocupavam o mesmo quarto descrito como “imundo e repulsivo”. Alguns trabalhadores eram forçados a trabalhar sem remuneração e sem comida. Ram Kumar Mahara, 27 anos, contou que foi agredido após reclamar para o seu gerente por estar há 24 horas sem comida – 12 horas de trabalho e uma noite inteira de fome: “Quando eu reclamei, meu gerente me agrediu, me chutou para fora do campo de trabalho e se recusou a me pagar. Eu tinha que pedir comida aos outros trabalhadores”.
A mão de obra estrangeira no Catar (1.199.107) é muito superior à nacional (71.076). Isso significa que os imigrantes constituem 94% da força de trabalho do Catar, e 70% de sua população total. Quase todos os trabalhadores migrantes têm dívidas desde o processo de recrutamento. As dívidas, o não pagamento de salários, o confisco de documentos e a incapacidade de os trabalhadores deixarem o local de trabalho constituem trabalho escravo. Diante de tantos casos de abusos, mortes e exploração, o embaixador do Nepal descreveu o emirado como “uma prisão aberta”.
Em resposta, o Comitê Supremo do Catar – órgão encarregado de organizar a Copa do Mundo – disse admitiu que estava preocupado com as acusações feitas contra os contratantes e afirmou que considerava a questão de extrema gravidade. Em fevereiro deste ano, o Catar anunciou regras para lidar com a exploração de trabalhadores na Copa. Segundo notícia publicada pela Reuters, essas medidas não tratam de um sistema de patrocínio para os trabalhadores migrantes, já estimados em 1.8 milhões de pessoas.
Com informações de The Guardian, Reuters e CSI
Imagem: Imagem: Flickr/CC/Marc Desbordes