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28 de setembro de 2023

A TERCEIRIZAÇÃO E O TRABALHO ESCRAVO

A relação entre a terceirização e o trabalho escravo, constatada em grande número das ações de fiscalização, chama a atenção para necessidade da devida diligência em direitos humanos. 

A terceirização no mercado de trabalho, que foi disciplinada pela Lei 13.429 (Lei das Terceirizações) e pela Lei 13.467 (Reforma Trabalhista), ambas de 2017, atendeu anseios de um grande conjunto de segmentos econômicos, que viam na prática um importante instrumento para garantir competitividade em seus mercados. Mas, passados alguns anos deste regramento, se acumulam evidências, produzidas pelas fiscalizações do Ministério do Trabalho, de que as terceirizações estão presentes em grande parte dos casos de trabalho escravo constatados no Brasil.  

 Constata-se, portanto, que, embora garantida pela legislação, a terceirização com grande frequência tem levado à vulnerabilidade de trabalhadores, no sentido contrário ao que prevê a Constituição. Esse cenário chama a atenção para o fato de que, a terceirização não exime as empresas de responsabilidades em relação aos trabalhadores. Uma das formas das empresas identificarem, prevenirem e mitigarem impactos adversos nesse sentido é realizando a devida diligência em direitos humanos, que consiste nos processos de governança empresarial voltados para assegurar obrigações e compromissos de proteção e promoção de direitos humanos.  

 O estudo “Terceirização e trabalho análogo ao escravo: coincidência?”, realizado pelo pesquisador Vitor Araújo Filgueiras, se valeu de dados oficiais da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) do Ministério do Trabalho e Emprego para apontar grande predominância das terceirizações nos dez maiores resgates de trabalhadores em condições análogas à de escravos ocorridos entre 2010 e 2013. De um total de 3 553 trabalhadores resgatados, 2 998 eram terceirizados.  

 Ao retomar o assunto mais recentemente, o pesquisador verificou que, em 86 resgates ocorridos na Bahia entre 2003 e 2016, 78% envolviam trabalhadores terceirizados. Neste ano, foram constatadas terceirizações fraudulentas nos três maiores resgates realizados com a participação do Ministério Público do Trabalho nas regiões de Bento Gonçalves (RS), Itumbiara (GO) e Acreúna (GO). 

 Conforme destacou a desembargadora aposentada do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4) Carmen Camino, em palestra proferida no ‘Seminário Inclusão Social de Vítimas Resgatadas do Trabalho Análogo à Escravidão’, realizado em junho pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o país vivencia um momento de “um recrudescimento impressionante da escravização de trabalhadores ou de fraudes aos direitos do trabalho, mediante uma terceirização que nada mais é que uma intermediação de mão de obra ilegal”.  

 A desembargadora aposentada também fez críticas à forma como foi conduzida a reforma trabalhista. “Essa tal reforma trabalhista foi feita em três meses, a toque de caixa, em regime de urgência, a partir de um projeto elaborado nos porões da Casa Civil da Presidência da República”, afirmou, lembrando que a reforma do Código Civil de 1916 levou 20 anos. Carmen Camino acrescentou que é preciso “buscar um código de trabalho capaz de abranger todas as relações de trabalho humano, em que a vulnerabilidade do trabalhador, empregado ou não, demanda proteção”. 

 Ela defendeu também a necessidade de produção de um novo código de trabalho. “Não é de agora que sustento a necessidade cada vez mais premente de nos unirmos todos, independentemente de posições ideológicas, em busca de um código do trabalho”, disse Carmen Camino. “Ou tomamos a coragem de rediscutir e redimensionar o direito do trabalho, ou vamos assistir à morte do direito do trabalho.” 

 

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