Trabalhadores são libertados de fazenda de soja e milho
Aliciamento de vítimas ocorreu na rodoviária de Luís Eduardo Magalhães (BA) e no assentamento Rio de Ondas. Parte dos empregados dormia em cima de pedaços de papelão e de plástico. Jovem de 16 anos estava entre escravizados
Por Bianca Pyl
A Gerência Regional do Trabalho e Emprego de Barreiras (BA), no Oeste do Estado, libertou 15 pessoas – incluindo um jovem de 16 anos – de trabalho análogo à escravidão. Os auditores fiscais receberam a denúncia de um trabalhador. A operação ocorreu entre 8 e 15 de outubro.
Os empregados eram explorados na Fazenda São Carlos, que fica no município de São Desidério (BA). Eles trabalhavam há dez dias na limpeza da área para iniciar o plantio de milho e soja. A propriedade é de difícil acesso e muito extensa. “Sem as indicações do denunciante, seria impossível chegar até o local. Tanto é que a fazenda nunca havia sido fiscalizada anteriormente”, relata Edvaldo Santos da Rocha, auditor fiscal que coordenou a ação.
O proprietário da fazenda contratou dois intermediários para arregimentar os trabalhadores no início do mês. No acordo, os “gatos” receberiam R$ 50 por hectare limpo. O aliciador conhecido como “Antônio” arregimentou oito pessoas na rodoviária de Luís Eduardo Magalhães (BA), com a promessa de pagar R$ 15 por hectare limpo aos trabalhadores.
“Nesta época do ano, é grande a procura por empregos na região. As vítimas aliciadas chegaram procurando serviço e foram ´presa fácil´ para o gato”, complementa Edvaldo. Os empregados vieram de cidades próximas a São Desidério (BA). Havia um tocantinense no grupo.
O outro “gato” contratado pelo proprietário, chamado de “Sandro”, foi até o Projeto de Assentamento Rio de Ondas, a 15 km da fazenda, e aliciou seis pessoas, mais o adolescente de 16 anos, que foi trabalhar junto com seu pai. O intermediário prometeu R$ 30 por hectare limpo.
As vítimas aliciadas na rodoviária dormiam em folhas de papelão e em cima de plásticos, dentro de um barraco de lona. Não havia instalações sanitárias no local. “Os trabalhadores do assentamento retornavam para casa todos os dias. O trajeto era feito de bicicleta e durava cerca de 40min”, explica o coordenador da ação, Edvaldo. Os empregados não tinham folgas, trabalhavam de domingo a domingo, das 6h da manhã até o final da tarde.
A água consumida vinha de um poço e ficava armazenada num caminhão pipa. O proprietário não apresentou atestado de potabilidade da água. A alimentação era preparada em uma fogueira feita dentro de um buraco. Nenhum trabalhador recebeu equipamento de proteção individual (EPI) ou teve sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) registrada.
“Os trabalhadores de Antônio não precisavam pagar pela alimentação. Mas já tinham uma dívida com o ´gato´: os itens de higiene pessoal, comprados em um mercado próximo a rodoviária, logo após o aliciamento”, conta o auditor fiscal. A turma arregimentada por Sandro trazia comida do assentamento. Contudo, o aliciador também oferecia alimentação, que era anotada em um caderno para ser descontada do pagamento.
Os trabalhadores receberam as verbas referentes à rescisão do contrato de trabalho e o valor da passagem para o retorno às suas regiões de origem. Além disso, terão direito ao Seguro-Desemprego do Trabalhador Resgatado. Seis autos de infração foram emitidos pela fiscalização.
O Ministério Público do Trabalho (MPT) não pôde comparecer à operação, segundo o auditor fiscal Edvaldo. Contudo, o relatório da ação será encaminhado ao órgão para que as devidas providências sejam tomadas.