Usinas com passivos exportam para Europa e EUA
Empreendimentos do setor sucroalcooleiro envolvidos em diversos problemas trabalhistas e ambientais venderam etanol para países ricos, que ensaiam normas relativas ao monitoramento socioambiental de importações
Por Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis
A intensificação do debate mundial sobre a sustentabilidade da produção de etanol e a conseqüente criação de mecanismos de monitoramento pelos setores público e privado nos Estados Unidos e na Europa não estão impedindo usinas brasileiras flagradas com irregularidades trabalhistas e ambientais de exportarem o combustível para o exterior.
A conclusão é do novo relatório da ONG Repórter Brasil sobre o setor canavieiro, chamado “O etanol brasileiro no mundo – Os impactos socioambientais causados por usinas exportadoras” e lançado nesta terça-feira (24). Ao cruzar informações sobre autuações trabalhistas e ambientais emitidas por órgãos oficiais com dados sobre grupos exportadores, o estudo detectou que vários deles estão presentes nas listas que apontam a ocorrência de problemas e, apesar disso, têm exportado etanol de cana-de-açúcar para países que já contam com legislações que pedem monitoramento socioambiental de importações.
O estudo relata as irregularidades socioambientais, bem como os destinos das exportações, de grupos como Cosan, Greenergy International, São Martinho, Louis Dreyfus Commodities, Carlos Lyra, Copertrading, Moema/ Bunge e Noble. Há casos de trabalho escravo, excesso de jornada de trabalho, falta de registro em carteira, despejo irregular de resíduos, queimadas não permitidas e uso de terra indígena para produção de cana.
Entre 2009 e 2010, foram registradas exportações de etanol por mais de 40 empreendimentos sucroalcooleiros instalados no Brasil – entre usinas, cooperativas ou empresas especializadas em comércio internacional. A Europa foi o principal destino do etanol brasileiro, com destaque para a Holanda (destino de 23 fornecedores, ao todo), Inglaterra (14), e Suíça (9). Os demais clientes de peso do combustível obtido a partir da cana-de-açúcar foram Estados Unidos (14), Japão (13) e Índia (8).
As exportações brasileiras de etanol caíram 42,4%, para 1,5 milhão de toneladas em 2010. O recuo se deve a um conjunto de motivos, como a redução da disponibilidade do produto para exportação, causada pelo aumento do consumo no mercado interno e o maior uso da cana para fabricação de açúcar, além dos persistentes efeitos da crise financeira internacional nos EUA e na Europa, que contiveram a demanda por combustíveis importados.
O governo e o setor privado brasileiro avaliam, porém, que a queda é conjuntural e apostam na consolidação do país como um importante exportador do produto a médio prazo. Essa mesma expectativa que vem incentivado governos estrangeiros e agentes do setor privado na tentativa de avançar acerca da definição de padrões de sustentabilidade para a importação de combustíveis renováveis, entre eles o etanol brasileiro.
Os Estados Unidos, por exemplo, maiores consumidores de energia renovável do mundo, exigem que as usinas cadastrem-se na Agência de Proteção Ambiental norte-americana em troca da redução das burocracias de exportação. É um procedimento simples, que pode ser realizado pela internet e que exige um relatório assinado por um profissional independente, com detalhes sobre o parque produtivo da usina. Há pouca chance de que algum cadastro seja negado, pois a EPA já classificou o etanol de cana como uma variedade de baixo carbono avançada.
No caso da União Européia, a principal peça normativa sobre combustíveis renováveis foi lançada em maio de 2009 e é chamada Diretiva 2009/28/CE. Ela determina que, até 2020, o bloco alcance uma cota de 20% de energias renováveis no consumo final bruto de energia e cada país-membro atinja a meta mínima de uso de 10% de energia renovável no setor de transportes.
Para dirimir problemas socioambientais, a diretiva determina uma série de critérios de sustentabilidade para a produção de biocombustíveis. Esses critérios devem ser seguidos da mesma maneira por fornecedores de dentro ou de fora do bloco. Isso significa que uma usina sucroalcooleira do Brasil deve cumprir os mesmos requisitos de sustentabilidade exigidos de uma companhia instalada na União Européia. Mas todos esses procedimentos ainda dependem de uma fase de regulamentação na própria União Européia e nos Estados nacionais que compõem o bloco.
O referido relatório é o 14º estudo produzido pelo Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis (CMA) da Repórter Brasil desde 2008. Pela terceira vez, o foco principal escolhido foi o setor sucroalcooleiro.
Para ler a íntegra do estudo, clique no link:http://www.reporterbrasil.org.br/documentos/Canafinal_2011.pdf
Mais informações no site do Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis